Canguçu, quinta-feira, 25 de abril de 2024
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Canguçu é o principal produtor de oliveiras do RS

Safra de azeitonas é recorde no RS, mas rende apenas 0,3% do azeite consumido no paísCerca de uma década e meia após ressurgir no Estado, o cultivo de oliveiras avança pela iniciativa de um pequeno grupo de produtores, que vem desbravando regiões e testando cultivares e técnicas de manejo adequadas ao clima e solos de […]


Safra de azeitonas é recorde no RS, mas rende apenas 0,3% do azeite consumido no país

Cerca de uma década e meia após ressurgir no Estado, o cultivo de oliveiras avança pela iniciativa de um pequeno grupo de produtores, que vem desbravando regiões e testando cultivares e técnicas de manejo adequadas ao clima e solos de diferentes localidades do Rio Grande do Sul.

O resultado é melhora da qualidade do fruto e volume recorde de 1,4 milhão de quilos de azeitonas, que ocorre principalmente pela expansão de 30% ao ano na área cultivada no Estado, segundo o Instituto Brasileiro de Olivicultura (Ibraoliva). Apesar do avanço, o volume rende apenas 0,3% do azeite consumido no país. Mesmo com baixa produção, o azeite brasileiro não para de acumular distinções em concurso internacionais. São mais de 50 prêmios no Exterior nos últimos três anos.

CANGUÇU É O MAIOR PRODUTOR NO RIO GRANDE DO SUL
Na lista dos principais municípios produtores no RS, divulgada pelo jornal GaúchaZH (veja ao final da matéria), Canguçu aparece no topo, seguido de Pinheiro Machado, Encruzilhada do Sul e Cachoeira do Sul.

– A safra está muito boa. Deveremos produzir entre 160 mil e 180 mil litros de azeite. E nosso produto é tão bom quanto os melhores do mundo – assegura o presidente do Ibraoliva, Eudes Marchetti.

Após o clima não ajudar ao longo de 2017, com pouco frio no inverno, o que gerou volume de apenas 50 mil litros, temperaturas mais baixas na estação em 2018 colaboraram para que o Estado conseguisse este ano uma colheita de alta qualidade. Para produzirem bem, as árvores precisam de ao menos 200 horas com temperaturas abaixo de 10°C, explica Marquetti. Se isso não ocorre, a floração se precipita. Hoje, são 5 mil hectares de oliveiras em solo gaúcho, sendo que apenas 40% da extensão está em produção, maturidade que nas árvores chega a partir de seis anos.

Graças ao clima mais propício, o Estado representa cerca de 70% da produção nacional. De acordo com o Ibraoliva, são 10 indústrias operando, com 20 marcas de azeite extravirgem no mercado. Depois, aparecem Minas Gerais, São Paulo e Paraná.

Embora existam pequenos produtores, predominam na atividade empresários e produtores rurais que tentam diversificar suas atividades.

– O perfil é basicamente de empresários urbanos. Isso cria um desafio maior, porque falta tradição na atividade – afirma Marchetti.

As áreas no Estado variam de dois hectares a 300 hectares. É possível conciliar a cultura com agricultura, como a produção de feijão, e a criação de ovelhas. O custo de implantação pode variar de R$ 10 mil a R$ 18 mil por hectare. O retorno, detalha o dirigente, pode vir a partir do nono ano. O diferencial é que, como é uma cultura perene, depois de o custo de implantação ser pago, as árvores seguem produzindo por décadas, desde que sigam os cuidados de manejo, como podas, nutrição das plantas e atenção às pragas e doenças.

CULTIVO CONVENCIONAL

Abertura da colheita oficial ocorreu na propriedade de Arno Werlang, em Formigueiro, na Região Central

Anfitrião da 8ª Abertura Oficial da Colheita da Oliva no Rio Grande do Sul, realizada na última sexta-feira (15), em Formigueiro, na Região Central, o desembargador aposentado Arno Werlang começou a investir em oliveiras há 13 anos. Há seis, produz o azeite Olivais da Fonte. Tem hoje 15 hectares cultivados e a intenção é chegar a 25.

– Este ano a safra está muito boa. O suficiente para ter algum retorno e perspectiva de sucesso. Mas a atividade não é fácil. Há muito romantismo – diz Werlang, entre empolgado e ponderado, lembrando que, inicialmente, calculava o retorno do investimento em cinco anos, mas o resultado começa a chegar apenas agora.

Werlang admite que uma das frustrações é não conseguir produzir de forma orgânica. Sustenta que, por ter a propriedade cercada por lavouras de soja, cultura que leva grande quantidade de agrotóxicos, insetos acabaram se refugiando nas suas árvores e, com isso, também precisou recorrer a químicos. Apesar de não ser o problema de Werlang, olivicultores do Estado também se queixam de prejuízos com a deriva do 2,4-D, utilizado também na oleaginosa, mas que vem afetando outras culturas.

A expectativa do empresário é obter 40 mil quilos de azeitonas e extrair 50 litros de azeite, que devem ser vendidos em Porto Alegre e em Santa Maria.

– É mais fácil vender o azeite do que produzir – atesta Marquetti, lembrando que, em regra, cada produtor elabora e comercializa seu próprio azeite, no valor que fica entre R$ 80 e 100 o litro.

Se a atividade mantiver o ritmo de crescimento, estima que, por volta de 2025, o azeite possa ser encontrado de forma mais generalizada no Estado.

– A atividade é rentável para quem vende o seu próprio azeite. Não vale a pena produzir a fruta e vender. Tem de ter agregação de valor. Futuramente, poderemos ter ainda produção de conservas de azeitonas, o que hoje se resume a pequenas experiências – diz o coordenador da Câmara Setorial da Olivicultura da Secretaria da Agricultura, João Paulo Lipp.

PRODUTORES SE ENCARREGAM DE CRIAR E DISSEMINAR CONHECIMENTO
Essencial para o desenvolvimento da agricultura no país, a pesquisa oficial, conduzida por órgãos de governo, é um dos gargalos da olivicultura. Empresários do setor lamentam que, por enquanto, a seleção e busca por variedades que melhor se adaptem às diferentes regiões e estudos sobre nutrição e manejo, por exemplo, têm sido realizados pelos próprios empreendedores.

– Faltam dados de campo. São os produtores que vão atrás de genética, tecnologia, e buscam técnicos no Exterior. Eu mesmo fui 10 vezes à Espanha. Mas fica difícil dar certo sem o apoio do Ministério da Agricultura, Embrapa e outras instituições – lamenta o presidente do Instituto Brasileiro da Olivicultura, Eudes Marchetti.

Ele recomenda, para quem for iniciar o plantio, usar espaçamento de cinco metros entre plantas e sete metros entre as linhas.

– Os primeiro olivais seguiram as orientações europeias e não deram certo. Neste período se adaptou muita tecnologia às nossas condições. Mas falta pesquisa aplicada. Quem estão fazendo isso são os produtores. Achando variedades, espaçamento, tratamento e adubação – exemplifica o coordenador da Câmara Setorial da Olivicultura da Secretaria da Agricultura, João Paulo Lipp.

Seleção de variedades e estudo sobre nutrição e manejo, por exemplo, têm sido realizados pelos próprios empreendedores

O empresário Lucídio Morsch Goelzer, diretor de projetos da Quinta da Estância, em Viamão, começou o plantio de oliveiras há nove anos, com a ajuda de técnicos da Embrapa. Foram 25 variedades testadas, mas no decorrer dos anos acabou tendo de tocar o projeto sozinho. Por iniciativa própria, gerou informações sobre o material genético que melhor produzia em uma região com temperaturas um pouco acima da média das demais regiões produtoras do Estado, informações como espaçamento entre as árvores e adubação:

– Visitei pomares na África do Sul, Estados Unidos, países da América Latina e Grécia para entender o que estava dando errado. Os produtores pesquisam e compartilham conhecimento.

Uma das queixas é de que a Embrapa começou a desenvolver variedades, prometeu lançá-las há três anos, mas ainda não chegaram ao mercado.

Jair Costa Nachtigal, chefe-adjunto de pesquisa e desenvolvimento da Embrapa Clima Temperado, em Pelotas, responsável pela olivicultura no Estado, lembra que a instituição sofre com falta de verbas para pesquisas e outras despesas, o que dificulta o trabalho em todos os setores:

– Como é uma planta perene, são avaliações que precisam ser feitas por décadas. E temos dificuldades de recursos.

LABORATÓRIO DA EMBRAPA PRECISA DE CREDENCIAMENTO
Nachtigal observa que, com as limitações, a Embrapa tenta colaborar em outras frentes, como o registro de variedades do Exterior que melhor se adaptam ao Brasil, procedimento que abre as portas para a produção de mudas e busca por financiamento para o plantio. Há dois anos, com recursos do Ministério da Agricultura, a Embrapa montou um laboratório de análise de azeite. Por meio de convênio com o Ibraoliva, é possível verificar a qualidade do produto. Apesar de ter sido montada com recursos do ministério e da Embrapa, que também é vinculada ao ministério, o laboratório ainda precisa ser credenciado pela pasta para fazer outros trabalhos, como por exemplo a análise de amostras para a fiscalização.

Nachtigal diz que a Embrapa trabalha desde 2006 com oliveiras e, após selecionar as cultivares, foram oito anos de avaliações de pontos como crescimento, produtividade, rendimento de azeite e sanidade para se chegar a quatro variedades com maior potencial de serem exploradas comercialmente na Região Sul. A expectativa da Embrapa é disponibilizar a produtores de mudas e olivicultores as duas primeiras cultivares genuinamente brasileiras até outubro e, em 2020, outras duas.

AUTODIDATA DAS OLIVEIRAS

Lucídio Morsch Goelzer, de Viamão, começou produção com base na tentativa e erro

contrariedade em pagar caro por azeites “falcatrua”, como diz, incentivou o empresário Lucídio Morsch Goelzer a começar o plantio de oliveiras, nove anos atrás. No início, a ideia era para suprir as necessidades da Quinta da Estância, empreendimento da família em Viamão, na região metropolitana de Porto Alegre. Os primeiros anos foram de dificuldades. O acompanhamento dos pomares pela Embrapa, com a avaliação de 25 variedades, acabou abandonado. A importação de técnicas europeias como espaçamento entre linhas e correção do solo também não deram certo. Mas, aos poucos, na base da tentativa e erro, o entusiasta Goelzer começou a dominar a arte de cultivar as oliveiras. Foi selecionando as variedades que melhor se adaptavam ao clima da região, com menos horas de frio abaixo de 10ºC ao longo do ano do que outras regiões produtores, especialmente na Metade Sul.

– O azeite que estamos extraindo é fantástico. Para concurso. Viamão se mostrou com um terroir espetacular – empolga-se Goelzer.

Esta safra, avalia o empresário, é a primeira grande colheita da propriedade. Ano passado, foram apenas 11 litros. Neste ano, serão em torno de mil litros. No próximo, espera-se de 6 mil a 8 mil, que serão rotulados com a marca Estância das Oliveiras. O olival é ainda atração e instrumento pedagógico para estudantes que visitam a Quinta da Estância. Mas, em um futuro breve, a produção de azeite extravirgem poderá ser a segunda fonte de renda do empreendimento, voltado ao turismo rural.

São 12 hectares cultivados e outros 14 hectares preparados para aumentar a aposta da propriedade na olivicultura. O próximo passo é adquirir equipamentos para produzir em casa o azeite, já que hoje a produção é terceirizada.

DESTAQUES DA PRODUÇÃO
O Estado passou de 80 hectares em 2005 para 5 mil hectares este ano.
O Ibraoliva estima que, até 2025, o Brasil atinja 20 mil hectares plantados.
A produção de azeitonas deve chegar a 1,4 milhão de quilos em 2019.
Em média, a cada cem quilos, 12% são azeite.
Para ser considerado extravirgem, o produto precisa ter grau de acidez até 0,8, um dos pontos mais observados para atestar a qualidade do produto, assim como ser beneficiado localmente para chegar fresco ao consumidor.

PRINCIPAIS MUNICÍPIOS PRODUTORES DO RS
Canguçu
Pinheiro Machado
Encruzilhada do Sul
Cachoeira do Sul
Caçapava do Sul
Santana do Livramento
Bagé
Barra do Ribeiro
Sentinela do Sul

VARIEDADES MAIS CULTIVADAS NO ESTADO
Arbequina
Koroneiki
Picual
Frantoio
Galega
Arbosana

Produção de azeitonas deve chegar a 1,4 milhão de quilos em 2019.

*Matéria produzida por Caio Cigana, do GaúchaZH, e reproduzida pelo Canguçu Online.
Fotos: Félix Zucco/Agência RBS